Seção (Prisma Fumê), Pinacoteca do estado, 2019
Exposição individual
Pinacoteca do estado, São Paulo, BR, 2019
Diante de Seção (prisma fumê), o visitante tende a enxergar, pelo menos por um instante, um vidro triangular no canto da sal, com a inclinação em ângulo agudo, dividindo o ambiente em dois, sem que haja nada dentro ou por trás desse limite. Fosse de fato um vidro, essa aqui seria a exposição de sua constituição física, de sua forma incompatível com as propriedades do material, de sua posição enviesada no espaço, de sua presença suspeita, como uma espécie de anteparo, uma vitrine e, ao mesmo tempo, um elemento cromático em contraste com o entorno. Estaríamos, então, em uma sala quase vazia.
Ocorre que a consistência material desse trabalho de Marcius Galan é ainda mais intangível. Seção (prisma fumê) resume-se à delimitação de uma área no formato de um triângulo equilátero, em paredes e piso, apenas com tinta, cera e ripas de madeira. Concretamente, a obra compõe-se de quase nada, e o volume que se insinua com o resultado d espantae sua montagem é virtual. Por isso mesmo, espanta a capacidade de essa peça fazer com tão pouco, com processos simples e austeros, que vejamos um vidro, um objeto rígido e transparente, em superfícies coloridas;
que vejamos em planos bidimensionais um campo tridimensional fechado, um confinamento em quina, frente ao qual acreditamos, por um momento, olhar através.
Mas o fato de o trabalho se realizar com o preenchimento de uma área por tinta e cor o transforma em pintura? Porque, em termos de linguagem, Seção (prisma fumê) opera principalmente com o vocabulário da escultura e da chamada instalação: com matéria, massa, escala, equilíbrio, luz, arquitetura, imersão… A obra parece, assim, oscilar, mover-se de modo alternado, entre as condições de objeto, espaço e imagem, quando dá a ver, por meio de uma única situação, a transparência, um recanto secionado e o vazio. Apresentada pela primeira vez em 2010, a peça integra uma série iniciada por Galan dois anos antes, em 2008, intitulada Seção. Tal conjunto, em que há sempre a sugestão de vidros instalados em espaços expositivos, tornou-se, com o tempo, uma das produções mais conhecidas do artista – e talvez seja, hoje, uma das mais representativas da arte brasileira recente.
José Augusto Ribeiro